São Camilo, um místico no cuidado e na caridade

Em nossa vida, existem muitas datas especiais, dignas de festa e comemoração, entre as quais o dia de nosso nascimento. No entanto, de forma estranha e sábia, a Igreja comemora a vida dos Santos e Santas na data de sua morte. Na verdade, a morte para este mundo é o nascimento para a eternidade. Assim, por longa Tradição da Igreja, as celebrações dos Santos e Santas, suas festas e memórias, recordam o dia da sua entrada no céu, o chamado “dies natalis” (o dia do nascimento).

Camilo de Lellis nasceu em 25 de maio de 1550 e morreu em Roma, em 14 de julho de 1614. Ambas as datas são importantes para a Ordem dos Ministros dos Enfermos (Camilianos); no entanto, a data festiva é sempre 14 de julho, quando Camilo entra na glória eterna. Esta ocasião é bastante significativa para todos os membros da grande Família Camiliana, seja religiosa ou leiga, que têm sua espiritualidade e missão inspiradas por São Camilo de Lellis.

Com efeito, o mesmo Deus que inspirou a Camilo extraordinária caridade para com os enfermos inflama também o nosso coração para continuarmos a missão ensinada pelo próprio Cristo: o cuidado para com os enfermos (cf. Mt 10,8). Daí decorre uma mística profunda que une cuidado e caridade. No humano que sofria, Camilo cuidava e contemplava o rosto do próprio Cristo, pois havia uma motivação clara e firme: “Todas as vezes que fizestes isso a um destes mais pequenos, que são meus irmãos, foi a mim que o fizestes” (Mt 25,40b).

Essa forte inspiração, segundo alguns biógrafos de São Camilo, atesta a sua grandiosidade, não só fisicamente, mas, sobretudo, na caridade fraterna. Ele fundou uma nova escola de caridade, mostrando que o cuidado com os doentes deveria ser com o mesmo amor com que uma mãe cuida de seu único filho doente. Mas o que seria a caridade se não se alimentasse de uma profunda espiritualidade cristã? Ora, quando dispensamos nossa atenção somente no “fazer”, corremos o risco de esquecer a oração, a meditação e o diálogo pessoal com Deus.

Camilo de Lellis conquistou as honras dos altares não tanto pelo seu fazer, que é algo inquestionável, mas por sua profunda espiritualidade, uma vida de oração intensa e simples, que poderíamos chamar de mística. Com certa frequência, recolhia-se diante do Crucificado, aninhava-se como uma águia nas fendas das altas rochas, praticando atos de humildade, contrição, abandono e caridade. Essa conduta humilde e caridosa são virtudes que fundamentam a espiritualidade cristã.

Quando falamos de espiritualidade cristã, falamos do primeiro dom do Ressuscitado aos seus discípulos: o Espírito Santo, unidade indivisa com o Pai e o Filho (cf. Jo 20,22b). O Espírito recebido age em cada pessoa, elevando ao máximo aquilo que há de mais humano nela. O dom que o Espírito doou a Camilo foi seu extremado amor para com os doentes – ser Cristo para o doente e servir a Cristo no doente. Desse modo, Camilo viveu e transmitiu sua profunda espiritualidade, revelando-se um místico da caridade, pois todo homem espiritual é um homem místico. Camilo foi todo de Deus e todo do doente, porque seu amor por Deus era expressado no cuidado e assistência aos enfermos (cf. 1Cor 12,12-13).

Na Bula Misericordiae Studium, de canonização de São Camilo, em 29 de junho de 1746, encontramos importantes relatos sobre a vida espiritual de Camilo: “o bem-aventurado Camilo de Lellis foi enriquecido deste espírito pelo céu: assumiu a missão de acolher e confortar todos os infelizes; e aqueles que não eram seu próximo nem por razão de pátria ou de sangue, decidiu, motivado pelo amor de Cristo, tomou a iniciativa de assumi-los e de dar-lhes assistência, serviço paterno e fraterno”.

Segundo Pe. Mário Vanti, no livro “Espírito de São Camilo”, para Camilo a escuta da Palavra de Deus é alimento para nutrir a vida espiritual. A oração que mais apreciava era o silêncio. Dizem que para rezar sua primeira Missa, passou 15 dias em silêncio e recolhimento. “Quando mordomo do Hospital São Tiago, introduziu o costume da leitura espiritual durante a refeição dos doentes. Com muito mais razão exigiu que isso fosse observado por seus religiosos durante a refeição comum […] o seu livro preferido era ‘A vida de Cristo’” (cf. VANTI, 2022, p. 98-99).

Partindo de sua experiência, ensinava aos seus religiosos que, na aridez de espírito ou no consolo espiritual, sempre agradecessem a Deus:

“quando estiverem em oração e sentirem devoção e consolo espiritual, agradeçam a Deus; quando não os sentirem, não se aborreçam e pensem sempre que não os merecem por causa de suas faltas. Mas mesmo quando se sentirem áridos e secos, não abandonem a oração. Antes, procurem intensificá-la mais do que nunca. E, embora lhes pareça que não conseguem concentrar-se em si mesmos, pelo menos esforcem-se e façam uma dessas três coisas: ou rezem o terço de Nossa Senhora, ou olhem para o crucifixo, e quando nem isso conseguirem, procurem combater e afastar de sua cabeça os pensamentos fúteis e ociosos” (cf. VANTI, 2022, p. 99).

São Camilo de Lellis, um místico no cuidado e na caridade. Seu coração ardia de um profundo amor, que só podia ser obra do Espírito. Costumava recordar aos religiosos as palavras do próprio Cristo: “Eu estava doente e cuidastes de mim” (Mt 25,36). Sua vida de oração era uma contínua intimidade com Deus. Contemplava nos doentes, com sentida emoção, a pessoa de Cristo. O leito do doente era o seu altar, lugar onde se realizava a mais solene liturgia, momento de uma profunda experiência de Deus.

O mundo ainda hoje reclama por pessoas apaixonadas por Cristo, que quer a misericórdia e não o sacrifício (cf. Mt 9,13). De Cristo recebemos um mandato, uma nova lei: Amar o próximo como a si mesmo. Quem ama o seu irmão com verdadeira caridade conhece a Deus, pois Deus é o Amor (cf. 1Jo 4,8).

Pe. Gilmar Antônio Aguiar, MI
Assessor eclesiástico da PSN

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